A pracinha tão bonitinha
Cheia de flores, de jardim
De cuidados especiais.
Idosos falantes reunidos,
Cães bem alimentados,
Crianças alegres e banhadas.
Pais e mães zelosos as vigiam.
O balanço funciona sem parar.
Revezamento de crianças.
Algumas babás as acompanham.
As crianças menores e as mães,
Vizinhos se cumprimentam.
Às vezes jogam conversa fora.
Bicicletas e atletas se ultrapassam.
Alguns estacionam e passeiam.
Outros vão à padaria lanchar.
Tem até ioga no tapetinho
bem cedinho da manhã.
Todos se divertem de manhã,
de tarde e de noite (até às 20h).
É tão democrática a pracinha.
Tem tanta sombra, tanto pássaro,
tanta grama, nem tem mato.
O caramanchão de lá é lindo.
Às 20h01 (é quase um exagero),
Bem educadas, olham para a direitae esquerda, algumas ainda no colo.
São as crianças pobres pretas
pedindo licença a um suposto dono
da pracinha bem cuidada.
Sobem na casinha de madeira,
escorregam, algumas se balançam
outras preferem a gangorra.
Estavam na calçada, no sinal.
Pediam dinheiro e comida alguns
instantes antes das oito da noite.
Entram como se não tivessem direito.
Nos bancos da pracinha,
as mães tornam-se rainhas.
Elas descansam enfim,
longe do perigoso olhar medroso,
sem chance de serem confundidas.
Alegres conversam entre si,
as mães e pais das crianças pobres.
São ex-pedintes do semáforo,
Muitas sem registro ou endereço.
Fazem um lanche compartilhado
Nas mesas para jogar xadrez.
Depois de lanchar na padaria,
Às 20h40, atravesso a pracinha
assistindo ao apartheid diário.
Vejo ali a liberdade e a prisão
A sorte deles e a minha sorte
Embaixo da copa das árvores.